Empowerment/ Empoderamento

 “Não acredito na autolibertação. A libertação é um ato social”
                                                                      (Paulo Freire)
               

Um conceito muito utilizado por autoras que escrevem sobre o teatro feminista e que permeia também o nosso processo de criação, é o conceito de empoderamento, no sentido que Paulo freire dá ao termo. Assim, ao optarmos por um método de trabalho embasado no "devised theatre" (já explicado aqui em postagem anterior), agregamos também o conceito de empoderamento, pois o "devised theatre" proporciona o empoderamento das envolvidas.

Vamos agora, nesta postagem, tentar deixar mais claro o significado deste termo utilizado não só no contexto de processos educativos, dentro da pedagogia libertadora proposta por Freire, mas também no contexto de organizações empresariais, conforme me deparei nas minhas pesquisas na rede. Utilizamos o termo no contexto do teatro, pensando o fazer teatral como uma ferramenta de empoderamento, podendo ser utilizada em diferentes contextos sociais que lutam por uma transformação.

Conforme o Glossário Social, o EMPODERAMENTO é:

“Processo pelo qual um indivíduo, um grupo social ou uma instituição adquire autonomia para realizar, por si, as ações e mudanças necessárias ao seu crescimento e desenvolvimento pessoal e social numa determinada área ou tema. Implica, essencialmente, a obtenção de informações, um processo de reflexão e tomada de consciência quanto a sua condição atual, uma clara formulação das mudanças desejadas e da condição a ser construída. A essas variáveis, deve somar-se uma mudança de atitude que impulsione a pessoa, grupo ou instituição para a ação prática, metódica e sistemática, no sentido de objetivos e metas traçadas, abandonando-se a antiga postura meramente reativa ou receptiva. Criado por Paulo Freire, este conceito ficou mais conhecido por sua versão em inglês – empowerment, que significa ‘dar poder’ a alguém para realizar uma tarefa sem precisar da permissão de outras pessoas. Observe-se, no entanto, que o termo em inglês trai o sentido original da expressão: empoderamento implica conquista, avanço e superação por parte daquele que se empodera (sujeito ativo do processo), e não, uma simples doação ou transferência por benevolência, como denota o termo inglês empowerment, que transforma o sujeito em objeto passivo” (SCHIAVO; MOREIRA, 2004: 59-60).

Paulo Freire e Ira Shor em Medo e Ousadia: O cotidiano do professor (1986), livro estruturado em forma de diálogo para falar de uma pedagogia dialógica, utilizam o termo empowerment [empoderamento] no contexto da educação. Diferentemente dos autores do Glossário Social, em Medo e Ousadia, Freire e Shor optam pela não tradução do termo “devido à riqueza da palavra [...], que significa A) dar poder a, B) ativar a potencialidade criativa, C) desenvolver a potencialidade criativa do sujeito, D) dinamizar a potencialidade do sujeito” (FREIRE; SHOR, 1986: 10). Aqui, fico na dúvida qual versão utilizar...

De acordo com Shor e Freire, empowerment é um termo utilizado na linguagem da pedagogia libertadora, juntamente com outras palavras, tais como, diálogo, conscientização e consciência crítica. 

O empoderamento, segundo Paulo Freire (1986: 71), não é suficiente para uma transformação social, porém ele é um passo fundamental. A partir do momento em que o sujeito sente-se empoderado e mais livre, ele precisa ajudar para que outras pessoas sintam o mesmo, para que, deste modo, possamos caminhar em direção a uma transformação global. Ira Shor explica que nos anos 1960, a ideia de uma pedagogia que pudesse mudar a sociedade, era muito popular, porém o a noção de empowerment nos Estados Unidos, historicamente, está associada à ideia de individualismo. Isso significa um apreço pelas pessoas livres e independentes que alcançam seu sucesso individualmente. O individualismo foi ainda mais motivado pelo crescimento econômico, pela acelerada modernização e pela busca do Sonho Americano e, aliado à isso, a limitada eficiência dos movimentos sociais. Este processo refletiu-se na pedagogia, incentivando o poder individual, a autoconfiança, autoajuda e auto-aperfeiçoamento. Assim, os esforços individuais ganham maior credibilidade do que a inteligência social e o poder político. Shor diz que “O individualismo é um mito espalhafatoso do capitalismo, que precisa de uma política de ‘dividir para conquistar’ contra a solidariedade das pessoas comuns que ele procura organizar numa cultura comercial e conformista, contradizendo o próprio individualismo que ele propõe” (FREIRE e SHOR, 1986: 72). Em outra página, Shor afirma que o culto ao invidualismo, sempre coexistiu com lutas sociais, como as ondas pela libertação feminina e as lutas pela igualdade racial.

 Já Freire, ampliando a questão colocada por Shor, trazendo o tema para o contexto latino-americano, diz que entende “o conceito de empowerment ligado à classe social” (1986: 72). Isto significa, para Freire, que “a questão do empowerment da classe social envolve a questão de como a classe trabalhadora, através de suas próprias experiências, sua própria construção de cultura, se empenha na obtenção de poder político. Isto faz do empowerment muito mais do que um invento individual ou psicológico. Indica um processo político das classes dominadas que buscam a própria liberdade da dominação, um longo processo histórico de que a educação é uma frente de luta” (FREIRE e SHOR, 1986: 72).

Podemos pensar então o empoderamento como um primeiro passo no processo de transformação social. Assim, mulheres empoderadas, a partir de um processo de criação teatral, pode compartilhar sua própria transformação com outras mulheres.


Referências:


FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986.

SCHIAVO, Marcio R.; MOREIRA, Eliesio N. Glossário Social. Rio de Janeiro: Comunicarte, 2004. Disponível em: http://www.comunicarte.com.br/site-comunicarte/downloads/glossario-social.pdf . Acesso em: 07 nov. 2011.

VALOURA, Leila de Castro. Paulo Freire, o educador brasileiro autor do termo Empoderamento em seu sentido transformador. Disponível em: http://www.paulofreire.org/pub/Crpf/CrpfAcervo000120/Paulo_Freire_e_o_conceito_de_empoderamento.pdf . Acesso em: 7 nov. 2011.

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